Fundo bilionário reacende disputa ideológica sobre igualdade racial no Congresso Nacional
A recente proposta de criação de um fundo bilionário destinado a políticas de promoção da igualdade racial voltou a acirrar os ânimos no Congresso Nacional, trazendo à tona divergências profundas entre parlamentares de diferentes espectros ideológicos. Batizado de Fundo Nacional pela Equidade Racial (FUNER), o projeto prevê a destinação inicial de R$ 10 bilhões para ações afirmativas, inclusão produtiva e combate ao racismo estrutural em todo o país.
A proposta, apresentada pelo governo federal na semana passada, tem apoio da bancada negra e de partidos progressistas, que veem na medida um avanço histórico. "É um passo concreto para reparar desigualdades históricas e dar oportunidades reais à população negra brasileira, que por séculos foi marginalizada pelas estruturas do Estado", afirmou a deputada Benedita dos Anjos (PT-RJ), uma das principais articuladoras do projeto.
Entre as ações previstas pelo fundo estão o financiamento de programas de empreendedorismo negro, bolsas de estudo para estudantes de baixa renda, incentivo à contratação de pessoas negras no setor privado, além de campanhas de conscientização e formação antirracista em escolas e instituições públicas.
Críticas e resistência
No entanto, o projeto enfrenta forte resistência da ala conservadora do Congresso, especialmente entre parlamentares ligados ao agronegócio e à base evangélica. Para esses grupos, o fundo representa uma forma de "discriminação reversa" e uma ameaça à igualdade de direitos prevista na Constituição.
"O que se propõe aqui é a criação de um privilégio institucionalizado baseado na cor da pele, o que fere frontalmente o princípio da isonomia. O Brasil precisa de políticas universais, e não de segregação estatal disfarçada de justiça social", criticou o deputado Marcos Farias (PL-MG), líder da oposição na Câmara.
Outros parlamentares também questionam a origem dos recursos para o fundo e temem impactos fiscais. Segundo o Ministério da Fazenda, os recursos virão de receitas extraordinárias, como dividendos de estatais e parte do superávit do petróleo do pré-sal, sem comprometer o teto de gastos ou o equilíbrio fiscal.
Mobilização nas redes e nas ruas
O debate rapidamente ultrapassou os corredores do Congresso e tomou conta das redes sociais, com manifestações pró e contra o fundo. Movimentos negros organizam atos em várias capitais do país para pressionar parlamentares a aprovarem a proposta, enquanto grupos conservadores convocam protestos contra o que chamam de "racialização da política pública".
Para o sociólogo Davi Monteiro, da Universidade Federal da Bahia (UFBA), o embate revela a dificuldade do Brasil em lidar com o próprio passado. "O país ainda reluta em reconhecer que o racismo é estruturante. Qualquer medida que confronte esse legado encontra resistência não só política, mas cultural", explica.
Próximos passos
A proposta do FUNER será analisada em comissão especial nas próximas semanas. A expectativa é que o texto final receba emendas e passe por intensas negociações até chegar ao plenário. O governo, por sua vez, já indicou que está disposto a ajustar pontos do projeto para garantir a aprovação.
Se aprovado, o fundo poderá se tornar uma das maiores iniciativas de combate ao racismo institucional na história do Brasil. Mas, até lá, o caminho promete ser turbulento e marcado por disputas que vão além da política — tocam no cerne de quem somos como nação.
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